quinta-feira, 18 de novembro de 2010

Santa Casa da Misericórdia de Benavente

Processo: 05B116

Nº Convencional: JSTJ000
Relator: FERREIRA DE ALMEIDA
Descritores: MISERICÓRDIAS
ASSOCIAÇÃO RELIGIOSA
SÓCIO
ADMISSÃO
ORGÃO SOCIAL
ELEIÇÃO
SUSPENSÃO DE DELIBERAÇÃO SOCIAL
COMPETÊNCIA CONTENCIOSA

Nº do Documento: SJ200502170001162
Data do Acordão: 17-02-2005
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recurso: T REL LISBOA
Processo no Tribunal Recurso: 7046/04
Data: 14-10-2004
Texto Integral: S
Privacidade: 1

Meio Processual: AGRAVO.
Decisão: NEGADO PROVIMENTO.

Sumário : I. O acto da Mesa Administrativa de uma Misericórdia relativo à admissão, filiação ou adesão de novos irmãos como membros efectivos da Irmandade respeita exclusivamente à vida interna ou inter-orgânica da instituição em causa, cuja fiscalização e tutela competem, por isso, ao "Ordinário Diocesano".
II. Não cabe, assim aos tribunais indagar da idoneidade ou da inidoneidade dos candidatos à filiação nesse instituto eclesial, e muito menos sindicar a "legalidade", ou sequer a oportunidade ou a conveniência, do acto de apreciação (positiva ou negativa) dessas candidaturas ou pedidos de filiação/admissão.


III. E daí a incompetência dos tribunais comuns "ratione materiae" para a sindicância da questionada legalidade e, consequentemente, para a apreciação de providência cautelar de suspensão da decisão da mesa administrativa - órgão executivo da Misericórdia - sobre a admissão de novos irmãos.


Decisão Texto Integral: Acordam no Supremo Tribunal de Justiça:

1. "A" e B requereram contra a Mesa Administrativa da Santa Casa da Misericórdia de Benavente, com data de 10-5-04, providência cautelar solicitando que a deliberação da Mesa Administrativa de 13 de Abril de 2004, que aprovou a entrada de 58 novos "irmãos", fosse suspensa até decisão final proferida na acção ordinária em que se discutia a validade da deliberação da Mesa Administrativa de 16 de Outubro de 2004. (ou 2003).

Alegaram, em suma, que um grupo de "irmãos" intentou procedimento cautelar e a respectiva acção principal, pondo em causa as deliberações de 16 de Outubro de 2003, que admitiu 16 novos elementos, e de 21 de Outubro de 2003, que teve em vista a eleição dos seus corpos gerentes, por serem ilegais, e por isso anuláveis.

A acção principal e providência cautelar encontram-se em fase de recurso, além de que existem ainda dois processos-crime a correr termos, pelo que a Mesa em funções deveria apenas exercer actos de gestão corrente, nos quais não se enquadra a deliberação aqui posta em causa ao aprovar a entrada de 58 "irmãos".

2. O Mmo Juiz do Tribunal Judicial da Comarca de Benavente, por despacho datado de 12-5-04 (fs. 23), julgou o tribunal incompetente em razão da matéria, absolvendo, em consequência, a requerida da instância, por considerar a matéria em apreço do foro exclusivo do Ordinário Diocesano que não dos tribunais comuns.

3. Inconformados, agravaram os requerentes, mas o Tribunal da Relação de Lisboa, por acórdão de 14-10-04, negou provimento ao recurso.

4. De novo irresignados, desta feita com tal aresto, dele vieram os requerentes agravar para este Supremo Tribunal, em cuja alegação formularam as seguintes conclusões:

1ª- O Tribunal "a quo" não especificou, como devia, os fundamentos de facto e de direito que justificam a sua decisão, ou seja, em relação aos factos subjacentes ao pedido formulado, não os separou, diferenciou ou especificou, a fim de se poderem distinguir e sobre eles assentar o regime jurídico adequado, em suma, não apreciou a competência para conhecer de todas as questões levantadas pelos recorrentes;

2ª- Mais do que ausência absoluta de decisão quanto a questões alegadas pelos recorrentes e que, a serem apreciadas, conduziriam a decisão diferente;

3ª- Por outro lado, o Tribunal "a quo" decidiu mal ao declarar-se absolutamente incompetente em razão da matéria para conhecer das irregularidades respeitantes à admissão dos 58 novos Irmãos pela Mesa Administrativa, com o fundamento de que se trata de matéria da exclusiva competência do Ordinário Diocesano, conforme dispõem os artigos 48° e 49° do DL n° 119/83, de 25/02;

4ª- As instituições com objectivos marcadamente sociais embora, também, de cariz religioso, como é o caso da recorrida, a Mesa Administrativa da Santa Casa da Misericórdia de Benavente, não deverão ser tuteladas pelo Ordinário Diocesano, visto que esta tutela não contempla o poder de verificação e de anulação de actos irregulares e / ou ilegais, o qual é próprio dos tribunais, no caso em apreço, dos tribunais comuns por força das regras gerais sobre a competência material dos tribunais;

5ª- Em suma, a Mma Juíza, ao ter decidido da forma que decidiu, violou, entre outros, o disposto no artigo 668°, n° 1, als. b) e d) e ainda o disposto nos artigos 7° do DL 519-G2/79, de 29/12, 98°, al. d), do DL 119/83, de 25/02 e 66° e 67° do Código de Processo Civil;

5. Contra-alegou a recorrida sustentando a correcção do julgado, formulando, por seu turno, as seguintes conclusões:
1ª- Delimitando os recorrentes, nas conclusões, o objecto do recurso ao despacho de 1ª instância, e não sendo possível, in caso, o recuso da decisão da 1ª instância para o Supremo Tribunal de Justiça, são ineptas as alegações oferecidas, pelo que devem as mesmas serem liminarmente indeferidas;

2ª- A questão prévia arguida pelos recorrentes é alheia à matéria do recuso, e como tal não deverá ser conhecida no douto acórdão que sobre o mesmo recair, acrescendo que, ao contrário do que estes alegam, a tomada de posse dos novos corpos gerentes da recorrida não violou qualquer comando judicial;

3ª- Não é impugnável uma deliberação de um órgão executivo de uma pessoa colectiva através de acção directa para os tribunais judiciais sem que, previamente, ela seja feita para a Assembleia Geral, nos termos do art. 412 do Código das Sociedades Comerciais, pelo que a utilização do procedimento cautelar de suspensão de deliberações sociais pelos recorrentes, para suspender uma deliberação da Mesa Administrativa da recorrida, deverá levar à improcedência do pedido;

4ª- Como bem refere o douto acórdão recorrido, o Tribunal de 1ª instância, ao declara-se incompetente para conhecer do pedido de suspensão da deliberação da Mesa Administrativa, em razão da matéria, não tinha de se pronunciar sobre os fundamentos daquele pedido, não havendo, por este motivo, omissão de pronúncia nem por parte da 1ª instância, nem por parte da decisão da Relação de Lisboa, a qual igualmente não se pronunciou sobre os fundamentos aduzidos pelos recorrentes em tudo o que foi para além da discussão sobre a competência do tribunal;

5ª- Como bem decidiu o douto acórdão recorrido, os tribunais judiciais são incompetentes, em razão da matéria - artigos 18°, n°1, da L 3/99, de 13/1 e do 66° do CPC - para conhecer do objecto do presente recurso, o que acarreta a absolvição da requerida da instância - artigos 105°, n° 1 e 288°, n° 1, alínea a), do C.P.C.;

Assim, o douto acórdão recorrido, ao confirmar a decisão da 1ª instância, não violou as normas indicadas nas alegações dos requerentes.

6. Colhidos os vistos legais, e nada obstando, cumpre apreciar.

7. Alegadas nulidades do acórdão por falta de especificação dos fundamentos de facto e de direito e por omissão de pronúncia - arts. 668 nº 1 alíneas b) e d) e 660, nº 2 do CPC.
Nas conclusões 1ª e 2ª da respectiva alegação, vieram os recorrentes arguir a nulidade da decisão:

- por um lado, porque o tribunal "a quo" não terá especificado, como devia, os fundamentos de facto e de direito que justificaram a sua decisão, ou seja, em relação aos factos subjacentes ao pedido formulado, não os separou, diferenciou ou especificou, a fim de se poderem distinguir e sobre eles assentar o regime jurídico adequado, em suma, não apreciou a competência para conhecer de todas as questões levantadas pelos recorrentes;
- por outro, face à ausência absoluta de decisão quanto a questões alegadas pelos recorrentes as quais, a serem apreciadas, conduziriam a decisão diferente.
Os agravantes não chegaram, porém, a esclarecer se tais vícios são de imputar à decisão de 1ª instância - caso em que o acórdão recorrido teria supostamente incorrido em erro de julgamento, que não em causa invalidante desse aresto - ou se ao próprio acórdão da Relação.
Pelo respectivo texto, essas conclusões parecem apontar para a decisão de 1ª instância, mas então jamais poderiam ser - insiste-se - invalidantes do acórdão recorrido.

E, de qualquer modo, o acórdão em causa não enferma de qualquer das sugeridas nulidades.
Quanto à primeira - ausência de especificação dos fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão - constituem doutrina e a jurisprudência concordantes as de que só uma ausência absoluta de fundamentação, que não uma fundamentação escassa, deficiente, ou mesmo medíocre, pode ser geradora da nulidade das decisões judiciais - conf., por todos o Prof. Alberto dos Reis, in " Código de Processo Civil Anotado, vol V, págs 139-140 e, entre outros, o Ac do STJ de 13-1-05, in Proc 3368/04 - 2ª Sec.
Ora, basta a simples compulsação do teor do acórdão sob apreciação para logo se alcançar o itinerário cognoscitivo e valorativo quanto à aplicação do direito seguido pelos julgadores na emissão do seu juízo jurídico-processual.

A recorrente pode discordar - como realmente discorda - do sentido decisório a final emitido, mas o que não pode é invocar quanto à mesma a violação do dever da respectiva fundamentação suficiente e congruente, que a mesma claramente externa e evidencia.

E, quanto à aventada nulidade por omissão de pronúncia, encontra-se esta espécie de nulidade por aventada «omissão de pronúncia» (artº 668º nº 1, al d), do CPC) directamente relacionada com o postulado no nº 2 do artigo 660º do mesmo diploma - dever o juiz resolver todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação.

Mas este último inciso normativo logo exceptua, também "expressis verbis", aquelas questões "cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras".
Sucede, todavia, que o tribunal se pronunciou sobre a única «questão» que, na oportunidade deveria ter apreciado prioritariamente relativamente mesmo à questão da recorribilidade do acto em apreço: a questão (de ordem pública) da competência do tribunal; tudo o mais constituía mera retórica argumentativa com vista ao reconhecimento do seu direito à invalidação do acto impugnado - fora, pois, do âmbito do agravo porquanto este circunscrito à questão da competência "ratione materiae".

E uma vez decidida tal questão prejudicada ficou, logicamente, a apreciação, sequer perfunctória, quer dos requisitos da procedência da requerida providência, quer da aventada ilegalidade do acto (deliberação) impugnado.
Improcede, pois, a arguição de nulidades do acórdão.

8. Pressuposto processual da competência do tribunal.
Encontra-se em causa a questão da determinação do tribunal competente para apreciação da legalidade da deliberação de 13-4-04 dimanada da entidade requerida e que aprovou a entrada de 58 novos Irmãos.

Seguiram as instâncias na peugada do Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 11-7-1985, in BMJ nº 349, pág. 432, no qual se entendeu que as Irmandades das Misericórdias constituem associações da Igreja Católica, encontrando-se "qua tale" submetidas à tutela da autoridade eclesiástica,.

E daí a incompetência dos tribunais comuns "ratione materiae" para a sindicância da questionada legalidade e, consequentemente, para a apreciação da providência cautelar a que se reportam os autos.

No Ac. desta 2ª Secção de 4-10-00, in Proc 234/00, não se encontrava em causa um acto de admissão de novos irmãos.
Insistem, entretanto, os agravantes em que a referida exclusividade não se estende às associações católicas que sejam também equiparadas a instituições de solidariedade social, como é o caso da Santa Casa da Misericórdia de Benavente, na medida em que a tutela canónica não contempla o poder de verificação e anulação de actos irregulares ou ilegais, mas que apenas se confina à vigilância do bom cumprimento dos princípios que as regem.

Regem, "prima facie", neste específico âmbito, quer o Código de Direito Canónico - nos termos do qual a Santa Casa da Misericórdia é uma associação destinada a promover a realização de actos de culto católico e dar satisfação a carências sociais (cfr. art. 10º), carecendo os seus estatutos da aprovação pela autoridade competente da Igreja e sujeitos à vigilância da autoridade eclesiástica (cfr. cânone 305, §§ 1° e 2° ) - quer os Estatutos próprios daquela concreta entidade.

Segundo o n° 1 do artº 1 ° do respectivo "Compromisso" (Estatutos) inserto por fotocópia de fs. 92 e ss., a Irmandade da Santa Casa da Misericórdia de Benavente é uma associação de fiéis, fundada em 1232, constituída da Ordem Jurídica Canónica para satisfação de carências sociais e para a realização de actos de culto católico, de harmonia com o seu espírito tradicional, informado pelos princípios da doutrina e da moral cristãs.

No n° 3 desse preceito estatutário estabelece-se que a aquisição da personalidade jurídica civil da Irmandade, bem como o seu reconhecimento como instituição privada de solidariedade social, são operados mediante participação escrita da sua erecção canónica - feita pelo Ordinário Diocesano aos serviços competentes do Estado - acrescentando o n° 4 do artº 1 ° que, em conformidade com a natureza que lhe provém da sua erecção canónica, a Irmandade está sujeita ao Ordinário Diocesano, de modo similar ao das demais associações de fiéis.

No que tange à administração das Misericórdias, o art. 26°, n° 1, do "Compromisso", estipula que os corpos gerentes da Irmandade são a assembleia geral, a mesa administrativa e o definitório ou conselho fiscal, sendo os corpos gerentes eleitos por períodos de três anos civis (cfr. art. 26°, n.° 2), nas condições e termos estabelecidos nos artigos 53° a 56° do mesmo "Compromisso".

A Mesa Administrativa - órgão executivo - é constituída por cinco membros efectivos e três suplentes (art. 38°) sendo apenas válidas as deliberações que forem tomadas com a presença da maioria absoluta dos membros em exercício (art. 42°).

A admissão dos "Irmãos", é feita mediante proposta assinada por dois "Irmãos" estranhos à Mesa Administrativa e pelo próprio candidato, proposta essa que é submetida à apreciação da Mesa Administrativa (cfr. art. 8° do Compromisso).

As associações assim constituídas, de harmonia com o artº 4° da Concordata de 1940 - então em vigor - "... podem adquirir bens e dispor deles nos mesmo termos por que o podem fazer, segundo a legislação vigente, as outras pessoas morais perpétuas, e administram-se livremente sob a vigilância e fiscalização da competente autoridade eclesiástica...", e se estas associações, para além dos fins religiosos, "... se propuserem também fins de assistência e beneficência em cumprimento de deveres estatutários..., ficam, na parte respectiva, também sujeitas ao regime instituído pelo direito português para estas associações ou corporações, que se tomará efectivo através do Ordinário competente, e que nunca poderá ser mais gravoso do que o regime estabelecido para as pessoas jurídicas da mesma natureza".

Tais associações encontram-se sujeitas à vigilância e à dependência da autoridade eclesiástica, nos termos dos cânones 305º e 323º do CDC.

É certo que, conforme decorre do disposto no artº 40° do Estatuto das Instituições Particulares de Solidariedade Social, aprovado pelo DL 119/83 de 25/2, as organizações e instituições religiosas que, para além dos fins religiosos também desenvolverem actividades enquadráveis no âmbito das prosseguidas pelas pessoas colectivas de solidariedade social, estão, quanto a tais actividades, sujeitas ao regime previsto no referido Estatuto. Mas, tal como dispõe o artº 48° do mesmo Estatuto, "sem prejuízo da tutela do Estado, "compete ao ordinário diocesano, ou à Conferência Episcopal, respectivamente, a orientação das instituições do âmbito da sua diocese, ou de âmbito nacional, bem como a aprovação dos seus corpos gerentes e dos relatórios e contas anuais".

Por sua vez, o artº 69° ainda desse mesmo Estatuto das IPSS, que se reporta ao regime jurídico aplicável, dispõe que às irmandades da Misericórdia "aplica-se directamente o regime jurídico previsto no presente diploma, sem prejuízo das sujeições canónicas que lhes são próprias", ressalvando-se, porém, - e este é o critério decisivo - tudo o que especificamente respeita às actividades estranhas aos fins de solidariedade social " (n°s 1 e 3 da citada norma).

O n° 2 do mesmo preceito legal estabelece que em tudo quanto na secção 2ª do capítulo 3° do mencionado diploma (que versa sobre as irmandades) não se encontre especialmente estabelecido, essas irmandades regular-se-ão pelas disposições aplicáveis às associações de solidariedade social.

Temos, pois, que os institutos e associações que tenham por fim o exercício da actividade especificamente religiosa são estranhos aos fins próprios da administração pública, mas se prosseguirem fins de beneficência ou de assistência, já ficarão sujeitas, nessa parte - mas apenas nessa parte - ao ordenamento jurídico geral instituído pelo Estado para as instituições particulares da mesma índole, sem prejuízo da disciplina e espírito religiosos.

Assim, como refere no sobredito Ac. do STJ de 10-7-85 - que vimos seguindo de perto - sem prejuízo da tutela do Estado, que se manifesta, além de outros modos, através da sua intervenção nos actos discriminados no artº 32° e ss. do Estatuto (aquisição e alienação de bens, empréstimos, realização de inquéritos, sindicâncias e inspecções, destituição dos gerentes por actos reiterados de gestão prejudicial, requisição de bens para utilização em fins idênticos, etc.), as instituições da Igreja Católica - assim se acolhendo as prescrições do Código de Direito Canónico - estão submetidas à tutela da autoridade eclesiástica que, no tocante às que tenham âmbito diocesano, é exercida pelo competente Ordinário, o qual as orienta, aprova os seus corpos gerentes e os relatórios e contas anuais (artigo 48°)".

Ainda na esteira do mesmo aresto, "... se ao Ordinário diocesano cabe, por força da lei a aprovação dos corpos gerentes das Misericórdias, caber-lhe-á também, por necessária inerência, verificar a regularidade da eleição, sob pena de ter de aceitar-se que a sua aprovação haveria de resumir-se à aposição de uma chancela sem qualquer sentido prático e efeito útil' (sic).

Assim, as (pretensas) irregularidades imputadas nos presentes autos à autoria da Mesa na "admissão de novos irmãos" não se situam num domínio em que se imponha o exercício de uma qualquer tutela (pública) do Estado, nem respeitam especifica e directamente à prestação dos fins assistenciais ou de solidariedade social da instituição, como bem se salienta no acórdão recorrido.

Encontra-se em causa, tão-somente, a vida interna ou inter-orgânica da irmandade em causa (relativa à filiação ou adesão de novos irmãos como seus membros efectivos) cuja fiscalização e tutela competem, por força do citado artº 48°, ao "Ordinário Diocesano".

Não cabe aos tribunais indagar da idoneidade ou da inidoneidade dos candidatos à filiação numa dado instituto eclesial (como é o caso de uma Misericórdia), e muito menos sindicar a "legalidade", ou sequer a oportunidade ou a conveniência, do acto de apreciação (positiva ou negativa) dessas candidaturas ou pedidos de filiação/admissão.

Torna-se, aliás, manifesto não subjazer aqui qualquer questão determinante da aplicação do disposto no artigo 7° do DL 519-G2/79, de 29/12, (o qual, mercê da ressalva constante do 98°, alínea b), do Estatuto aprovado pelo DL 119/83, se mantém em vigor), situação que reclamaria, ela sim, a intervenção dos tribunais (estaduais) para a respectiva sindicância.

9. Bem concluíram, por isso, as instâncias pela incompetência material dos tribunais comuns de jurisdição ordinária nos termos dos artigos 18°, n° 1, da L n° 3/99, de 13/1 e do artigo 66° do CPC, para conhecer do objecto da subjacente providência cautelar, pelo que bem absolvida foi da instância a entidade requerida e ora agravada, "ex-vi" do disposto nos artigos 105°, n° 1 e 288°, n° 1, alínea a), do CPC.

10. Decisão:
Em face do exposto, decidem:
- negar provimento ao agravo;
- confirmar, em consequência, o acórdão recorrido.
Custas pelos recorrentes.

Lisboa, 17 de Fevereiro de 2005
Ferreira de Almeida
Abílio Vasconcelos
Duarte Soares

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