Bispo Auxiliar de Lisboa, D. Carlos Azevedo é uma voz da Igreja Portuguesa que se faz ouvir com flagrante actualidade. Esteve no Funchal na passada sexta-feira e falou ao JM sobre os problemas do país
Contencioso com as Misercórdias é uma falsa questão
JM - Outro assunto a merecer reparos da parte da Igreja Católica no nosso país, é o alegado contencioso existente entre a hierarquia e os dirigentes das Misericórdias, a propósito de um Decreto da Conferência Episcopal que acaba de ser rejeitado pelos responsáveis da União das Misericórdias. Como vê esse assunto?
DCA - Acho muito estranha esta reacção da União das Misericórdias porque o que presidente da Conferência Episcopal Portuguesa (D. Jorge Ortiga) escreveu uma carta aos Provedores explicando muito claramente tudo o se pretendia com esse Decreto, que foi interpretado como perda de autonomia ou intervenção da Igreja nas Santas Casas.
Não é verdade que o citado Decreto tem esse objectivo. O que se pretende é clarificar a natureza jurídica das Misericórdias e nada mais, é a única coisa que está aqui em jogo.
Tudo continua como dantes, a autonomia, as contas. Apenas são prevenidos abusos porque foram histórias de abusos que aconteceram no Algarve, em Évora, e recentemente no Porto, que demonstraram à saciedade que as Misericórdias são de facto instituições de natureza pública e não privada. E quisemos clarificar isso.
Sabemos que há forças que não o desejam dentro da própria União das Misericórdias, mas talvez a maioria dos Provedores seja capaz de reconhecer que este estatuto jurídico não vem alterar essencialmente o procedimento actual.
Portanto, é uma reacção um pouco exagerada que eu não compreendo bem depois da carta que o presidente da Conferência Episcopal Portuguesa escreveu com o intuito de clarificar e a dizer o que se estava a passar.
Havia já um certo mal-estar que era preciso esclarecer a nível jurídico, mas isto não significa, de maneira nenhuma, alterar procedimentos, apenas evitar exageros.
Quando, por exemplo, a Misericórdia pretende vender uma parte do seu património que exceda uma determinada verba, isso tem que ir à aprovação, porque pode não servir os fins da instituição e as Misericórdias foram criadas para os pobres, com finalidades muito concretas.
Ou seja, trata-se de uma vigilância normal, de uma tutela salutar. Quando aconteceu de forma diversa e foi preciso ir a Tribunal - quer o Tribunal civil, quer os mais altas instâncias da Santa Sé, despacharam o pretenso contencioso a favor dos Bispos, essa é a verdade.
O diálogo e o bom-senso vão facilitar ainda mais estes esclarecimentos, estou convencido disso.
JM - Quer dizer, o referido Decreto que considera as Misericórdias portuguesas como associações públicas de fiéis é irrevogável?
DCA - Sim, não estamos aqui em jogos de poder. As pessoas entram na relação com a Igreja como se fosse uma relação política, mas não é disso que se trata.
Há princípios, e os princípios são estes, mas depois podemos ver como eles se aplicam, dada a história maravilhosa das Misericórdias ao longo dos séculos.
Ninguém quer alterar os procedimentos, só queremos esclarecer a natureza jurídica para não haver abusos nem ambiguidades.
As pessoas, com certeza, não querem situações dúbias, e isso é que se quis corrigir.
Estamos também convictos de que perante o contacto pessoal e a experiência vivida, as pessoas vergam a sua atitude e redescobrem alguma coisa que lhes faz bem à alma.
Neste momento, precisamos sobretudo disso, porque isso é que nos permite depois reagir às dificuldades económicas e sociais, com falávamos há pouco.
O entendimento da Igreja é este, como também já salientou o porta-voz da Conferência Episcopal Portuguesa, Pe. Manuel Morujão: “As Misericórdias continuarão a auto-governar-se, os Bispos diocesanos não são eles que mandam nas Misericórdias, mas a Igreja Católica exerce a tutela eclesiástica, o que deve ser algo considerado normal, até porque também há a tutela do Estado e sabemos que essa tutela não é para mandar, gerir, administrar as Misericórdias, mas é para ter a última palavra”.
Jornal da Madeira
Contencioso com as Misercórdias é uma falsa questão
JM - Outro assunto a merecer reparos da parte da Igreja Católica no nosso país, é o alegado contencioso existente entre a hierarquia e os dirigentes das Misericórdias, a propósito de um Decreto da Conferência Episcopal que acaba de ser rejeitado pelos responsáveis da União das Misericórdias. Como vê esse assunto?
DCA - Acho muito estranha esta reacção da União das Misericórdias porque o que presidente da Conferência Episcopal Portuguesa (D. Jorge Ortiga) escreveu uma carta aos Provedores explicando muito claramente tudo o se pretendia com esse Decreto, que foi interpretado como perda de autonomia ou intervenção da Igreja nas Santas Casas.
Não é verdade que o citado Decreto tem esse objectivo. O que se pretende é clarificar a natureza jurídica das Misericórdias e nada mais, é a única coisa que está aqui em jogo.
Tudo continua como dantes, a autonomia, as contas. Apenas são prevenidos abusos porque foram histórias de abusos que aconteceram no Algarve, em Évora, e recentemente no Porto, que demonstraram à saciedade que as Misericórdias são de facto instituições de natureza pública e não privada. E quisemos clarificar isso.
Sabemos que há forças que não o desejam dentro da própria União das Misericórdias, mas talvez a maioria dos Provedores seja capaz de reconhecer que este estatuto jurídico não vem alterar essencialmente o procedimento actual.
Portanto, é uma reacção um pouco exagerada que eu não compreendo bem depois da carta que o presidente da Conferência Episcopal Portuguesa escreveu com o intuito de clarificar e a dizer o que se estava a passar.
Havia já um certo mal-estar que era preciso esclarecer a nível jurídico, mas isto não significa, de maneira nenhuma, alterar procedimentos, apenas evitar exageros.
Quando, por exemplo, a Misericórdia pretende vender uma parte do seu património que exceda uma determinada verba, isso tem que ir à aprovação, porque pode não servir os fins da instituição e as Misericórdias foram criadas para os pobres, com finalidades muito concretas.
Ou seja, trata-se de uma vigilância normal, de uma tutela salutar. Quando aconteceu de forma diversa e foi preciso ir a Tribunal - quer o Tribunal civil, quer os mais altas instâncias da Santa Sé, despacharam o pretenso contencioso a favor dos Bispos, essa é a verdade.
O diálogo e o bom-senso vão facilitar ainda mais estes esclarecimentos, estou convencido disso.
JM - Quer dizer, o referido Decreto que considera as Misericórdias portuguesas como associações públicas de fiéis é irrevogável?
DCA - Sim, não estamos aqui em jogos de poder. As pessoas entram na relação com a Igreja como se fosse uma relação política, mas não é disso que se trata.
Há princípios, e os princípios são estes, mas depois podemos ver como eles se aplicam, dada a história maravilhosa das Misericórdias ao longo dos séculos.
Ninguém quer alterar os procedimentos, só queremos esclarecer a natureza jurídica para não haver abusos nem ambiguidades.
As pessoas, com certeza, não querem situações dúbias, e isso é que se quis corrigir.
Estamos também convictos de que perante o contacto pessoal e a experiência vivida, as pessoas vergam a sua atitude e redescobrem alguma coisa que lhes faz bem à alma.
Neste momento, precisamos sobretudo disso, porque isso é que nos permite depois reagir às dificuldades económicas e sociais, com falávamos há pouco.
O entendimento da Igreja é este, como também já salientou o porta-voz da Conferência Episcopal Portuguesa, Pe. Manuel Morujão: “As Misericórdias continuarão a auto-governar-se, os Bispos diocesanos não são eles que mandam nas Misericórdias, mas a Igreja Católica exerce a tutela eclesiástica, o que deve ser algo considerado normal, até porque também há a tutela do Estado e sabemos que essa tutela não é para mandar, gerir, administrar as Misericórdias, mas é para ter a última palavra”.
Jornal da Madeira
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