A União das Misericórdias Portuguesas (UMP) foi criada quando em 1975 as Misericórdias foram alvo de agressão externa. Agressão esta que consistiu, numa primeira fase, na estatização dos hospitais das Misericórdias sediados nas capitais dos distritos e, posteriormente, dos concelhios.
Recordamos que muitos destes hospitais tinham sido construídos ou atos de benemerência individual/familiar ou por iniciativa da própria Misericórdia apelando à generosidade dos cidadãos.
Muitos dos hospitais concelhios foram construídos já no século XX. Um das formas mais divulgadas então para angariação de fundos foi a organização anual de cortejos de oferendas.
As populações sentiram que a estatização, também denominada nacionalização dos hospitais, decretada pelo governo de então, lhes tirava algo de seu que tinha nascido do seu esforço pessoal e que existia para lhes acudir em casos de necessidade.
A estatização/nacionalização desses hospitais nunca foi, plenamente, aceite pelas populações locais.
Aconteceu até que num ou noutro caso muito particular o hospital se manteve sempre em funcionamento sob a responsabilidade da Misericórdia. Casos houve também que os hospitais, apesar de estatizados/nacionalizados foram sempre conservados pela respetiva Misericórdia.
A legislação que determinou a estatização/nacionalização dos hospitais previa a extinção das Misericórdias que ficassem sem qualquer atividade. E pelo menos num caso assim aconteceu.
Foi neste contexto de expropriação do património coletivo das comunidades locais que as Misericórdias sentiram necessidade de criarem uma estrutura que agregasse a vontade comum das Misericórdias de forma a reagir à estatização/nacionalização dos hospitais.
Assim, surgiu a UMP como conclusão do V Congresso das Misericórdias realizado em Viseu.
Foi a UMP, Presidida pelo Dr. Virgílio Lopes, figura que está ignorada pela atual estrutura dirigente, que reagiu à estatização dos hospitais evitando até o desaparecimento de muitas Misericórdias que tinham como única atividade a administração/gestão dos seus hospitais.
Foi por iniciativa da UMP, com o apoio unânime das Misericórdias que o Dr. Virgílio Lopes que estas Instituições conseguiram ver consagrado o direito à indemnização pela estatização/nacionalização dos hospitais assim como ao pagamento de renda pela utilização dos edifícios onde funcionavam os hospitais.
Foi também por iniciativa que muitas Misericórdias recomeçaram do nada criando estruturas de apoio residencial a idosos, as quais são designadas na atualidade por lares.
Numa segunda fase e procurando dar resposta à famílias laboriosas que necessitavam de apoio diurno para as suas crianças surgiram os então denominados infantários ou conhecidos por jardins de infância.
Numa sequência do hoje conhecido por empreendedorismo social e inovação as Misericórdias foram criando serviços e estruturas de apoio às respetivas comunidades de forma a corresponder à necessidades que as populações foram sentindo.
Estas estruturas foram sendo criadas sempre de uma forma sustentada para que a continuidade dos serviços e estruturas jamais fosse posta em causa.
Importa ressalvar que até não há muitos anos as Misericórdias foram administradas pelos seus órgãos sociais constituídos por Irmãos desempenhando funções em regime de voluntariado, ou seja, respeitando os princípios da Doutrina Social da Igreja (DSI), do Dom e Gratuidade.
Foi neste contexto que as Misericórdias se voltaram a constituir como referências institucionais e organizacionais de apoio aos que sofrem e que foram atingidos por alguma forma de pobreza.
E assim foi até há uns anos atrás, hoje, por maioria de razão os dirigentes das Misericórdias deveriam permanecer fiéis a esses princípios da DSI do Dom e da Gratuidade, exercendo os cargos dos órgãos sociais das Misericórdias em regime de voluntariado não remunerado.
Outro tanto deveriam observar os dirigentes da UMP. Aqui por maioria de razão até porque alguns deles já beneficiam de remunerações pagas pelo Estado, ou seja, são funcionários públicos, no ativo, mas destacados a tempo inteiro para prestarem serviço na UMP.
Neste período de crise que afeta um número crescente de famílias e de cidadãos justificar-se-á que os dirigentes da UMP e das Misericórdias não usufruam de qualquer remuneração.
Dever-se-á ter presente um dos princípios básicos que inspira as Misericórdias: os que mais podem devem ajudar os que mais precisam.
Ora, acontece que por iniciativa dos dirigentes da UMP é cada vez maior o número de Irmãos que integram, nomeadamente, as Mesas Administrativas das Misericórdias que são remunerados.
esta situação é fator originário de desvios os princípios fundacionais tendo graves consequências na vida das Misericórdias, onde surgem prioridades desvirtuadoras e aproveitamentos individuais que têm conduzido a acusações e condenações judiciais a que a comunicação social tem dado eco.
Estas situações têm contribuído e muito para a descrença e descredibilização institucional e também dos seus dirigentes.
Queremos acreditar que os Homens Bons de que Portugal tem, constituem um bom exemplo para o mundo, ao ponto de as Misericórdias Portuguesas e/ou de origem Portuguesa serem reconhecidas, internacionalmente, como um dos pilares da nossa identidade nacional, voltem a tomar as rédeas destas seculares instituições de bem fazer, fazendo o bem.
Se sempre se justificou que os dirigentes das Misericórdias exercessem os cargos de uma forma gratuita e voluntária, neste período de crise em que os recursos são cada vez mais escassos mais se impõe que esses mesmos dirigentes não usufruam de qualquer remuneração.
E quando essa remuneração é obtida por situação de favor, ao arrepio das regras e da lei muito menos justificação existe para que seja recebida por quem a ela não tem direito, nem mora nem de facto.